sábado, 28 de abril de 2012

Sobre a modernização na (e não da) educação pública, a prática de ensino e o amor: algumas notas.

 O que percebo no pouco de experiência que tenho no magistério estadual e na rede municipal do Rio de Janeiro é que há um escancarado esforço dos governantes em promover a depreciação do trabalho do professor com vistas a minar seus esforços e manter a população alienada e sem possibilidade crítica de atuação (sobretudo nas urnas). Isso porque as ações de modernização das escolas, cada vez mais dotadas de parafernálias tecnológicas e sistemas informatizados, por si só, pouco ajudam no processo de ensino-aprednizagem e, ainda pior, sobrecarregam os professores com atribuições burocráticas e administrativas, antes da alçada da secretaria (como o lançamento de notas online). Esses projetos mirabolantes, cujos gastos são na maioria das vezes superfaturados e beneficiam empresas de "conhecidos" dos governantes, retiram a autonomia pedagógica do professor, tornando-os simples operários cujos trabalhos são o seguimento da "cartilha digital" e o cumprimento de todos os tramites pré-estabelecidos. É a pratica descarada do "vigiar e punir", só que desta vez os professores são os alvos.

Os dois sistemas que posso avaliar (pelo uso ou pela capacitação para o mesmo) são o "Docente online" da SEEDUC e o "Escola 3.0" da SMERJ. O primeiro teve um lançamento frustrado no ano de 2010, ocasião na qual o governador licitou milhares de computadores (alugados) e implantou nas escolas o diário digital que teve dois problemas básicos e cabais: o primeiro era a conexão ao servidor que consegue ser pior do que qualquer site de relacionamento dos dias atuais. O resultado foi professores desesperados gastando horas e horas (muito excedentes ao Horário de planejamento ou complementar) ou mesmo dinheiro em lan houses quando as escolas não tinham laboratório suficiente. O segundo e mais perverso foi o fato de o sistema obrigar o professor a abrir as aulas e fazer a chamada "virtual" em tempo real, o que tomava quase um tempo de aula devido ao fato de a presença ser feita com o cartão "Rio Card" aluno pro aluno. Nessa ocasião o caos era total. Isso somado ao fato de as turmas serem superlotadas e aproveitarem essa hora para deixar o professor simplesmente sem ação (ou tentava manter a ordem ou cumpria o dever tecnológico). A parte do sistema referente ao diário online foi deixada de lado  no mesmo ano e até hoje o lançamento de notas leva cerca de 3 vezes o tempo real necessário (o problema não é a conexão é o servidor, ou melhor, o problema não é a conexão, é a educação).

Já o sistema "Escola 3.0" da SME que será lançado dia 02 de maio deste ano (semana que vem) é uma versão similar ao Conexão Educação, mas "na velocidade 3". Todos os professores da rede muncipal estão apreensivos, sobretudo os de carga horária elevada (40h). Além de ter que digitar o planejamento diário no computador (que segundo boatos será um tablet de 7 polegadas), o sistema requer a avaliação individual do aluno, o que com turmas de 40 a 55 alunos torna-se inviável. Por exemplo, um professor de 40h, no momento, tem 32 tempos de aula divididos em cerca de 11 turmas, ou seja, quase ou mais de 500 alunos. Além disso, o professor tem que seguir os passos do planejamento que não batem com os cadernos didáticos distribuídos bimestralmente pela SME e nem com a ordem do livro didático e além de tudo isso tem por quase obrigação dar aulas com o educoédia (as aulas virtuais). Não se sabe como será a vida útil do sistema, o que se sabe apenas é que ele segue a lógica do "vijiar e punir" e punir para "economizar".

Os governos (municipal o estadual) querem "produtividade" e não "qualidade" na educação. Os números são o que importa. Outra coisa é o fato de nem todos os professores saberem utilizar o computador com rapidez ou eficiência. Nesses casos as secretarias não querem saber. Saber usar computado ou tablet com Andróide não é pré-requisito para o concurso público. Daqui a um tempo os professores que já estão cada vez mais obrigados a fazer "up grade"  (utilizando amplificadores de voz em face à má educação dos alunos e da superlotação das salas; utilizando passo a passo digital em aulas virtuais e estando conectados a um sistema computadorizado de gestão) poderão sem nenhum problema, serem substituídos por andróides completos, baratos e que não reclamarão das exigências cada vez maiores de produtividade e número.
E ainda tem estudantes de licenciatura que se iludem com falsas constatações de quem não está na sala de aula e acha que o problema está no professor e que os alunos (e seus pais, mitos deles, descompromissados) têm o dever de "reclamar" da falta de amor. Alguém avise a eles que o talvez o sistema na velocidade 5.0 tenha embutido um aplicativo que gere amor em meio à guerra.


Aproveito para indicar a leitura do conto  "Mulinha tecnológica" no link abaixo: